sábado, 23 de fevereiro de 2013

Sonhos

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Estava dormindo. Alguma coisa dentro do meu sonho, ou fora dele, me fez acordar. Tudo permanecia aparentemente igual.
No meu sonho, ou em algum lugar que não sei definir bem, eu vi uma pessoa encarcerada há tempo, parecia mais esquecida que presa. Não sei ao certo como mas se alimentava dos restos de um outro que morava num prédio ao lado.
Todos os dias este outro, livre e lembrado embora também não pudesse sair de casa por uma incapacidade qualquer, recebia visitas de um tipo de mestre de musica ou professor de outra arte.
As aulas eram direcionadas ao sujeito livre, mas de alguma forma elas iluminavam e irrigavam a vida do esquecido.
De dentro daquilo que parecia uma cela, ele esperava ansiosamente.
Cada nota, cada pincelada, toda a atenção.

http://amanda.org.br/
Saudações cordiais,
O Estudante.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

O mundo à maneira humana

Afinal, do que é feito o mundo como nós, HUMANOS, o percebemos?
Numerosos pensadores se debruçaram sobre este tema e as conclusões são das mais diversas.


O mundo é realmente o que nós enxergamos?
(Para entender o sentido da pergunta filosófica é preciso entender um pouco de linguagem, simbolo, signo, significante e convenção)
Se por acaso surgir uma afirmativa em resposta a pergunta anterior vem logo outra em seguida.
Existe condição de garantirmos que isto é real?

Não tenho pretensão de responder todas essas questões nas poucas linhas seguintes. Meu maior anseio é registrar a dúvida. A dúvida, o incomodo, o desequilíbrio, são fundamentais para a criação de conceitos novos.

Registre-se em pixeis: Todas as críticas são aceitas. Quem sabe com ela construímos um ponto de discussão em comum? E a partir dai, quem sabe?

Pensem agora. Qual a finalidade de se criar o novo? Por que mexer no que está quieto? Há quem diga que isso faz perder o juízo. Não discordo que a possibilidade tem fundamento, mas o objetivo não é esse, portando quando sentires que as coisas estão saindo do padrão é melhor parar de pensar. Voltar às atividades cotidianas (Portas em automático) ajuda a parar o pensamento fragmentário, indica o caminho à loucura boa, a loucura circular. Já falei em texto anterior da loucura circular.

Este tipo de dúvida serve para pessoas mentais. Pessoas que se fazem pessoa com essa espinha atravessada na garganta. Para pessoas mentais a análise e confronto de dúvidas gera prazer incomensurável. Já para as pessoas emocionais o caminho da dúvida não é tão atrativo.

É preciso que o caminhante faça auto-análise.

Não existe predileção, nem tipo de pessoa certo ou errado. O importante é seguir caminhando como bem narrou o incomparável Eduardo Galeano.




Boa reflexão.

Saudações cordiais,
O Estudante.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Solidão



A solidão é a certeza cruel.
Não adianta espernear, praguejar ou enfeitar. A morte só aceita um por vez. Não há exceções...

O diálogo não passa de uma tentativa de moldar a realidade à sua guisa  O consenso é burro e ingênuo.

A impossibilidade de transmissão adequada te compele a calar. Essa ideia na mente não encontra terreno fértil quando lançada além-mente.

São dois caminhos que levam à mesma solidão.
Falar sozinho, impossível fazer de outra forma, aliás, falar consigo mesmo.
Calar sozinho e enfrentar a companhia da mente e as vezes do corpo.

Não há o que falar em comunicação. Eu finjo que falo e você finge que me entende nesta loucura circular chamada ironicamente de normalidade.


A limitação do vocabulário aumenta a dificuldade em decifrar os significantes alheios, minam a comunicação.

Aos amantes deveria ser proibido conversar. Os corpos entendem de amar, a mente só atrapalha.

Em conversas nos mais variados temas escutamos aqui e acolá, com certa frequência:
-Ponha-se no meu lugar.
(C'est impossible)
Desculpe mas é impossível, o que está além-mente é suposição, convenção, mentira ou pior.

A falha do escravo da mente é (tentar) racionalizar o imponderável.

Dar sentido ao CAOS nem sempre é o mais acertado a se fazer. Me parece bem mais humano simplesmente estar além. CAOS ou ORDEM. Estar.

A necessidade por certezas é estéril e inebriante. Caminho à frustração.

Não consigo lembrar de outra coisa, senão, da aranha que tece sua teia apesar do vento.

É engraçado lembrar de como somos humanos ao despertar, existe ali, naquele momento, uma brecha, uma janela que logo se fecha sem avisar e as coisas voltam a fazer sentido.

A linearidade retoma majestosamente seu lugar.

Saudações cordiais,
O Estudante

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O que impulsiona nossa espécie


Esses dias fiz uma viagem e mergulhei no universo de outra cultura, mais precisamente no universo da cultura Afro-Brasileira. Presenciei uma grande cerimônia do Candomblé.

Homens, mulheres, crianças e adolecentes. Gente de várias cidades e estados, juntos para realizar as festividades.

Procurei entre o sobe e desce de entidades e espíritos alguma coisa que eu pudesse reconhecer como divino, foi em vão. Com meus olhos destreinados para este tipo de ritual, só pude ver homens. Nada além disso.

Me pergunto. O que nos move a seguir crenças ou simplesmente não segui-las? Sartre bem antes de mim, pensou a respeito, e afirmou que os homens em geral tem ânsia por uma finalidade para a vida.

Ele responde a este questionamento através da alegoria do corta-papel.

Sartre observou que, a maioria do homens demonstra através de suas ações uma necessidade extrema em encontrar um sentido para a vida, uma finalidade precípua à sua existência.
A busca se torna na maior parte das vezes um estorvo, um peso enorme de frustração e desinteresse pelas coisas simples que compõem o cotidiano.



Em contraponto à ideia do corta-papel, o pensador francês, definiu o ser humano através de uma outra alegoria. A da pedra lascada.

A pedra lascada não fora criada. Foi descoberta, significada e transmudada pelo uso humano em ferramenta. Segundo este pensamento, a pedra lascada ganha valor no nosso mundo simbólico, como símbolo além da coisa em si. É portanto o olhar humano que dá sentido as coisas. Sentido CRIADO, INVENTADO, INTERPRETADO e ADAPTADO.

Perceber o papel do olhar do OUTRO neste mundo simbólico e conceitual não é das tarefas mais fáceis.

Boa reflexão.
Saudações Cordiais,
O Estudante.


PS: Esse texto teve inicio em 25 de setembro de 2011 e ficou esquecido por um tempo, esses dias eu consegui finalizá-lo.

domingo, 11 de novembro de 2012

Fragmentos


Ouvi certa vez da boca do Doutor que na vida, para que valesse a pena a passagem, era preciso fazer das pequenas notas uma bela sinfonia. Ele disse aquilo inspirado no Deleuze. Pouco tempo depois inaugurei este espaço.
Em minhas leituras e buscas, aleatórias e rizomáticas, encontrei Eduardo Galeano. Topei com ele na revistaria do TIP em recife. De lá pra cá tenho me reinventado através das Histórias e Estórias contadas em forma de fragmentos, verdadeiras notas que se transformam nas mais belas sinfonias que uma página pode contar. Abraços, Bocas, Filhos, Espelhos, Tempo, Mundo e Avesso.
Cada um cheio de pequenos presentes.

Aprendi que existiu uma tribo na Terra do Fogo. E que nos tempos idos os Onas adoravam vários deuses. O deus supremo se chamava Pemaulk.
Pemaulk significa palavra.

Aprendi dos Maias, mais precisamente de uma comunidade Tojolabal, um cumprimento mais humano.
-Eu sou outro você.
-Você é outro eu.

Aprendi que hierarquia e disciplina não são o que parecem ser.
Aprendi a duvidar ainda mais das minhas quase inexistentes certezas.
Aprendi a ser mais humano e menos civilizado.

A música reverbera com mais intensidade.
As cores pedem cada dia mais atenção.
O tempo passa e enxergo mais.

A alegria e a tristeza trespassam meu corpo.
Me regojizo com a vida.
Não sou mais triste nem alegrinho.
Estou aprendendo a me fazer e desfazer.

Inspirado na aranha que tece sua trama a despeito do vento.

Saudações Cordiais,
O Estudante.




domingo, 5 de agosto de 2012

Você já se deparou com ninguém?


Hoje me deparei com toda uma família de ninguéns.
Impossível não me lembrar do GRANDE Eduardo Galeano.

Aproveito a lembrança para contar o acontecido com um pouco de Galeano e um pouco de mim:

Encontrei uma família de ninguéns.
Mãe nenhuma, Pai ausente, filhos ninguéns...
Donos de nada, quase inexistentes.

Os olhos tão bem treinados de nossa sociedade não conseguem enxergá-los.
Estavam literalmente marginalizados, em um canto recuado da praia, para que suas carcaças quase translucidas não atrapalhassem o espetáculo da maravilha da criação.
Maravilha que pertence aos escolhidos.

Os ninguéns devem ter pago um PLANO barato, pensou comigo o Doutor.

Nada de diferente nesta maravilha dominical do que é a praia em uma cidade do litoral.
Estavam lá todas as criaturas.
Os homens e as mulheres. As crianças e os animais de companhia. Todos curtindo a boa-aventurança...
Estavam lá os bem aventurados e estavam lá os ninguéns.

Eu também não os vi de pronto. Foi preciso que um deles do sexo feminino, com idade de criança, me abordasse no caminho do carro.
- Moço, me dá um trocado?
Respondi que não tinha ali e que teria no carro.
Prontamente aquela que parecia ser a Mãe nenhuma disse a ninguém que me acompanhasse.
Assim ela o fez, carregando consigo um bebê ninguém e acompanhada de perto por outro ninguémzinho que mal sabia caminhar.
O ninguémzinho cambaleante de fome ou de inexperiência me acompanhou.
Olhando pra cima me disse:
- Osssoo, Caaaadimmm.
E repetiu com um sorriso estranho para aquela criatura, me fez lembrar uma criança:
- Daaaaaaa... Caaaadiiiimmm.
Perguntei ao ninguémzinho qual era seu nome. Talvez se ele me dissesse aliviasse minha angústia.
- Ele não sabe falar. Interrompeu a menina que parecia ser sua irmã.
Quis saber sua idade.
- Ele tem dois anos.
Perguntei a dela.
- Eu tenho doze. Me respondeu carregando ainda um outro ninguém no colo. Este eu não precisava perguntar, de olhar percebi que era muito novo.

O Doutor me alcançou no carro e se antecipou entregando o "Caaadddimmm" para a menina.
Sem acompanhar a cena ele percebeu o que eles queriam por ali.
Não é tão difícil perceber...
Basta ter olhos que vejam e ouvidos que escutem.

O ninguémzinho não percebeu que sua irma recebera o trocado e repetiu:
- Daaaááa Caaaadiiimmm.
Ela o puxou pelo braço e seguiram.
Nós entramos no carro e seguimos.

A maravilha da vida  continuou, nenhuma bola parou, nenhum copo deixou de se esvaziar, nem uma boca de mastigar. Na praia, tudo continuava pesadamente normal. Nada tinha acontecido, nem acontece alíás.

Poucos minutos depois o Doutor falou:
- Difícil é ver gente dessa idade nessa situação.

- Difícil é saber que ele aprendeu a mendigar antes de falar, respondi.

E seguimos calados o resto do caminho.

Deixamos uns trocados e levamos nó na garganta.

Quem eram eles? Não sei. Não tinham nome.
Eram Ninguém.


Boas reflexões,
O Estudante

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

O Arquivo - Victor Giudice

Tive oportunidade de conhecer o autor, através de um trabalho acadêmico na disciplina Hermenêutica Jurídica.
Encontrei o conto no livro: Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século - Organizado por Italo Moriconi

 Escolhi trabalhar com O Arquivo de Victor Giudice primeiro por empatia com a maneira sublime e o estilo utilizado na composição de seus versos.  Segundo por encontrar na sua história elementos que levam a crer que o poeta ora comentado foi um daqueles que lutou contra a ditadura mesmo estando dentro do sistema.

Victor Marino del Giudice nasceu em Niterói, no dia 14 de fevereiro de 1934 e morreu em 22 de novembro de 1997, viveu durante um período de mudança no cenário político nacional, o período da ditadura militar (1964-1985), e viu o povo ir às ruas em busca de liberdade, em busca de justiça. 

Giudice aborda a temática da coisificação do homem no ambiente laboral. Com maestria e singularidade segue pela corrente contrária, levando consigo o leitor que acompanha a vida de joão, funcionário modelo, como se seu objetivo maior fosse servir à empresa até extinguir-se. 

Boa leitura e reflexão.

Saudações cordiais,
O Estudante





No fim de um ano de trabalho, joão obteve uma redução de quinze por cento em seus vencimentos. joão era moço. Aquele era seu primeiro emprego.
Não se mostrou orgulhoso, embora tenha sido um dos poucos contemplados. Afinal, esforçara-se. Não tivera uma só falta ou atraso. Limitou-se a sorrir, a agradecer ao chefe.
No dia seguinte, mudou-se para um quarto mais distante do centro da cidade. Com o salário reduzido, podia pagar um aluguel menor.
Passou a tomar duas conduções para chegar ao trabalho. No entanto, estava satisfeito. Acordava mais cedo, e isto parecia aumentar-lhe a disposição.
Dois anos mais tarde, veio outra recompensa.
O chefe chamou-o e lhe comunicou o segundo corte salarial.
Desta vez, a empresa atravessava um período excelente. A redução foi um pouco maior: dezessete por cento.
Novos sorrisos, novos agradecimentos, nova mudança.
Agora joão acordava às cinco da manhã. Esperava três conduções. Em compensação, comia menos. Ficou mais esbelto. Sua pele tornou-se menos rosada. O contentamento aumentou.
Prosseguiu a luta.
Porém, nos quatro anos seguintes, nada de extraordinário aconteceu.
joão preocupava-se. Perdia o sono, envenenado em intrigas de colegas invejosos. Odiava-os. Torturava-se com a incompreensão do chefe. Mas não desistia. Passou a trabalhar mais duas horas diárias.
Uma tarde, quase ao fim do expediente, foi chamado ao escritório principal.
Respirou descompassado.
- Seu joão. Nossa firma tem uma grande dívida com o senhor.
joão baixou a cabeça em sinal de modéstia.
- Sabemos de todos os seus esforços. É nosso desejo dar-lhe uma prova substancial de nosso reconhecimento.
O coração parava.
- Além de uma redução de dezesseis por cento em seu ordenado, resolvemos, na reunião de ontem, rebaixá-lo de posto.
A revelação deslumbrou-o. Todos sorriam.
- De hoje em diante, o senhor passará a auxiliar de contabilidade, com menos cinco dias de férias. Contente?
Radiante, joão gaguejou alguma coisa ininteligível, cumprimentou a diretoria, voltou ao trabalho.
Nesta noite, joão não pensou em nada. Dormiu pacífico, no silêncio do subúrbio.
Mais uma vez, mudou-se. Finalmente, deixara de jantar. O almoço reduzira-se a um sanduíche. Emagrecia, sentia-se mais leve, mais ágil. Não havia necessidade de muita roupa.
Eliminara certas despesas inúteis, lavadeira, pensão.
Chegava em casa às onze da noite, levantava-se às três da madrugada.
Esfarelava-se num trem e dois ônibus para garantir meia hora de antecedência.
A vida foi passando, com novos prêmios.
Aos sessenta anos, o ordenado equivalia a dois por cento do inicial. O organismo acomodara-se à fome. Uma vez ou outra, saboreava alguma raiz das estradas. Dormia apenas quinze minutos. Não tinha mais problemas de moradia ou vestimenta. Vivia nos campos, entre árvores refrescantes, cobria-se com os farrapos de um lençol adquirido há muito tempo.
O corpo era um monte de rugas sorridentes.
Todos os dias, um caminhão anônimo transportava-o ao trabalho.
Quando completou quarenta anos de serviço, foi convocado pela chefia:
- Seu joão. O senhor acaba de ter seu salário eliminado. Não haverá mais férias. E sua função, a partir de amanhã, será a de limpador de nossos sanitários.
O crânio seco comprimiu-se. Do olho amarelado, escorreu um líquido tênue. A boca tremeu, mas nada disse. Sentia-se cansado. Enfim, atingira todos os objetivos. Tentou sorrir:
- Agradeço tudo que fizeram em meu benefício. Mas desejo requerer
minha aposentadoria.
O chefe não compreendeu:
- Mas seu joão, logo agora que o senhor está desassalariado? Por quê? Dentro de alguns meses terá de pagar a taxa inicial para permanecer em nosso quadro. Desprezar tudo isto? Quarenta anos de convívio? O senhor ainda está forte. Que acha?
A emoção impediu qualquer resposta.
joão afastou-se. O lábio murcho se estendeu. A pele enrijeceu, ficou lisa. A estatura regrediu. A cabeça se fundiu ao corpo. As formas desumanizaram-se, planas, compactas. Nos lados, havia duas arestas. Tornou-se cinzento.
joão transformou-se num arquivo de metal.